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Risk

Imagine que você chegue ao trabalho e um colega lhe proponha o seguinte:

“Me dê uma moeda. Vou lançar essa moeda ao chão. Se a face virada pra cima for cara, você me paga R$ 10; se for coroa, eu lhe pago R$ 11”

Você aceitaria a aposta?

Note que não há resposta certa ou errada. Pessoas simplesmente diferem quanto a sua percepção de risco e ao prazer que desfrutam em situações arriscadas.

Em experimentos feitos por economistas e psicólogos, contudo, a grande maioria dos participantes responde não. Embora tenha um valor esperado positivo – retorno médio de 50 centavos – em geral não nos sentimos atraídos por esse tipo de aposta.

A economia clássica explica este resultado combinando dois ingredientes: a teoria da utilidade esperada (expected utility theory) e a hipótese de que o benefício marginal do dinheiro é decrescente. Traduzindo: a hipótese assume que o valor (utilidade) que uma pessoa atribui a 1 real adicional diminui à medida que sua riqueza aumenta; e a teoria diz que indivíduos avaliam opções arriscadas levando em conta – ao mesmo tempo e de maneira consistente – a probabilidade e o valor (utilidade) atribuído a cada possível resultado.

Agora imagine que, ao lhe ver dizer não para a primeira aposta, o dono da empresa, um bilionário excêntrico, se aproxima e diz:

“Tenho uma nova proposta. Agora, se a face virada pra cima for cara, você me paga R$ 100; se for coroa, eu lhe dou R$ 200.000”

Ninguém em sã consciência rejeitaria essa proposta. Entretanto, a teoria clássica prevê que um indivíduo que, esteja rico ou pobre, sempre diz não à primeira aposta também irá dizer não a esta segunda aposta!!!

Este exemplo, criado pelo economista Matthew Rabin, deixa evidente que a teoria clássica é insatisfatória para explicar por que muitas pessoas rejeitam a primeira aposta.

É aqui que entram algumas das contribuições da economia comportamental, que busca trazer para a teoria econômica ideias do campo da psicologia. Duas delas, em particular, foram bastante influentes no desenvolvimento de alternativas à teoria clássica de decisão sob incerteza.

Ideia 1 – As pessoas avaliam situações que envolvem riscos em termos de ganhos ou perdas.

Para a economia clássica, ao analisarmos a primeira aposta pensamos no efeito que perder R$ 10 (ou ganhar R$ 11) terá em nosso patrimônio total. Para os adeptos da economia comportamental, por outro lado, nós avaliamos cada decisão de forma isolada e nos importamos com o fato de ganhar ou perder dinheiro.

Ideia 2 – As pessoas são avessas a perdas.

Desgostamos de uma perda de X reais mais do que gostamos de um ganho de X reais. Ou seja, o sofrimento de perder uma quantia de dinheiro é maior do que a satisfação de ganhar a mesma quantia.

Várias teorias de decisão sob incerteza que incorporam as duas ideias citadas acima foram sugeridas nas últimas décadas. A mais influente delas se deve aos psicólogos Daniel Kahneman (Nobel de 2002) e Amos Tversky. A teoria proposta por esses autores, cujos detalhes ficarão pra outro post, é capaz de explicar por que dizemos não à primeira aposta e sim à segunda.

A influência da economia comportamental cresceu exponencialmente desde pelo menos os anos 80 – o trabalho de Kahneman e Tversky é um dos três mais citados em economia nos últimos 100 anos. Ainda assim, a teoria clássica continua muito utilizada. Praticamente todos os modelos macroeconômicos de bancos centrais, por exemplo, assumem que as pessoas agem da maneira sugerida pela teoria da utilidade esperada.

A principal razão para isso é que a teoria clássica é matematicamente elegante e fácil de ser aplicada a diversas áreas do conhecimento. Avanços recentes, contudo, parecem indicar que as ideias propostas por psicólogos e economistas comportamentais estão tomando o coração e as mentes – e os modelos – da maioria dos economistas.

A teoria – e a prática – econômica só tem a ganhar com isso.

5 Comentários

  1. Sem dúvia o ser humano é avesso ao risco, mas se nao me engano, o próprio Kahneman encontra difereças na percepçao do risco em indivíduos inseridos em culturas diferentes, e além disso (aí vai uma analogia da minha cabeça) acredito ser possível afirmar que a própria história de vida dos sujeitos vai influenciar nessa tomada de decisao. Daí a importancia de aproximar a psicologia e a economia nesse tipo de estudo.

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    • Felipe Augusto de Araújo

      Paulo, concordo 100%. Inclusive, um de meus projetos atuais é tentar entender como a exposição a situações econômicas extremas, em particular a hiperinflação no Brasil, pode afetar a percepção de risco das pessoas.

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  2. Rodrigo Barbosa

    Ótimo post Felipe!!!

    A única coisa que ainda percebo, na contramão do seu artigo, é a adesão à Economia Comportamental. Ainda vejo essa vertente sendo encarada com muita restrição no mundo acadêmico, apesar de ter melhorado nos últimos anos.

    Abs

    Rodrigo Barbosa

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  3. Por acaso existe algum artigo que fale da relação ou diferenças entre a praxeologia e a economia comportamental?

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  4. Felipe Augusto de Araújo

    Bruna, nunca encontrei um trabalho que discuta isso. Mas assim que encontrar, vou colocar no blog 😉

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