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Economia Comportamental é o campo de estudo que incorpora lições da Psicologia ao estudo de Economia. Pesquisadores da área utilizam diferentes métodos de investigação, que podem ser divididos em duas grandes categorias: métodos empíricos, que utilizam dados reais, e métodos teóricos, que desenvolvem modelos matemáticos abstratos. Os estudos empíricos, por sua vez, subdividem-se entre os que utilizam dados coletados por terceiros (como governos) e os que coletam seus próprios dados (em laboratório ou em campo). Estes últimos são chamados métodos experimentais.

O método experimental, contudo, não é exclusivo da Economia Comportamental. Outra área, a Economia Experimental, utiliza métodos similares para estudar a economia clássica (ou tradicional). Os infográficos a seguir destacam essas relações.

 

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Assim como a Economia Comportamental, a Economia Experimental vem ganhando destaque nos últimos anos, a ponto de ter um de seus estudiosos premiado com um Prêmio Nobel. Em 2002, o economista Vernon Smith recebeu o prêmio por ter estabelecido experimentos em laboratório como ferramentas de análise econômica empírica, especialmente no estudo de mecanismos alternativos de mercado.

Embora sejam áreas distintas, Economia Comportamental e Economia Experimental tem muito em comum. Em especial, como os métodos experimentais utilizam seres humanos para testar suas teorias, o comportamento observado muitas vezes é melhor compreendido se visto pelas lentes da Psicologia.

Para exemplificar a similaridade entre as duas áreas, quero compartilhar com vocês alguns trabalhos apresentados no 20º Workshop da IFREE, que aconteceu em janeiro deste ano e reuniu 24 estudantes de doutorado do mundo todo (inclusive o autor deste post). A IFREE (International Foundation for Research in Experimental Economics), fundada por Smith em 1997, é uma entidade que patrocina projetos de pesquisa e apoia o desenvolvimento de estudantes da área.

No que segue, falo sobre dois dos mais interessantes trabalhos apresentados no workshop. Vocês podem conhecer os demais vendo a programação completa aqui.

Acessar a Internet no trabalho reduz a produtividade?
Acesso à internet e intensidade do trabalho

O acesso a formas de lazer via internet é comum no mercado de trabalho moderno. A qualquer instante podemos fazer uma pausa para checar as redes sociais, ver e enviar mensagens de texto, etc. Neste estudo, Bruce Corgnet, Roberto Hernán-González e Eric Schniter desenvolvem um experimento em laboratório para testar como a escolha de intensidade de trabalho se altera quando as pessoas passam a ter essa opção de lazer. No experimento, os participantes resolvem uma série de somas de números de dois dígitos e recebem um pagamento para cada resposta correta.

A um conjunto de participantes foi dada a opção de poder navegar na internet e receber um pagamento fixo e menor do que receberiam resolvendo as somas. Os resultados indicam que a opção de lazer diminui a intensidade de trabalho somente quando a remuneração é baseada no desempenho do grupo. Quando a remuneração de um participante depende unicamente do seu esforço, a possibilidade de acesso à internet não interfere na intensidade do trabalho.

Dinheiro facilita a cooperação?
Moeda como mecanismo de coordenação

Há uma tipo de experimento em laboratório conhecido como trust game. Funciona assim: dois participantes são aletoriamente selecionados para formar um par. Um deles, participante 1, recebe, por exemplo, $ 10 e tem duas opções: ou fica com os $ 10 para si ou envia os $ 10 para o participante 2. Se 1 decidir enviar o dinheiro, o montante é triplicado e o participante 2 decide como dividir o montante final, igual a $ 30. Note que o participante 2 pode optar por manter os $ 30 para si.

Neste jogo, o resultado eficiente é o participante 1 sempre enviar o dinheiro. A evidência experimental, contudo, raramente mostra esse resultado. Do ponto de vista do participante 1, há um risco de que o participante 2 lhe devolva menos do que os $ 10 iniciais, ou mesmo que não lhe devolva nada. Por isso a cooperação nem sempre é alcançada. Em um experimento usando este jogo, Gabriele Camera, Marco Casari e Maria Bigoni mostram que a inclusão de um token, um objeto sem qualquer valor intrínseco, mas que pode ser trocado pelos $ 10 iniciais, aumenta significativamente os níveis de cooperação. A ideia dos autores é de que as moedas possam ter surgido não só como um mecanismo eficiente para a realização de trocas, mas também como um meio de aumentar a cooperação entre agentes econômicos.

Espero que os exemplos acima tenham esclarecido a relação entre as duas áreas. Afinal, um dos estudos trata de procrastinação e incentivos individuais versus incentivos em time, e o outro aborda questões de confiança e interdependência entre desconhecidos. Não é por acaso que quem dividiu o prêmio Nobel de 2002 com Vernon Smith foi o Psicólogo Daniel Kahneman, um dos fundadores da Economia Comportamental.

8 Comentários

  1. Ana Maria Bianchi

    bom q vc tenha feito esta distinção, Felipe, pois os dois campos de pesquisa se interpenetram mas não se confundem, como muitos pensam. Também apreciei sua referência a exemplos reais de pesquisas, interessantes.
    Tenho duas observações a fazer:
    1) as pesquisas experimentais estão sempre associadas a testes de laboratório, q podem ser também ser feitos no campo. Há vários tipos de pesquisas empíricas q não tem esse formato. Sei q vc tem consciência disso, mas seu texto poderia deixar mais claro.
    2) o conceito de “economia clássica” está ligado a smith, Ricardo, mill, etc, antes da revolução neoclássica. Não é equivalente a economia tradicional.

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    • Felipe Augusto de Araújo

      Prof. Ana Maria,

      Obrigado pelos comentários.

      Poderia ter citado a obtenção de dados próprios através de pesquisas de opinião, algoritmos online, etc. Optei por citar muitos casos para simplificar a exposição. Quanto ao segundo ponto, você tem razão. Daqui pra frente vou me referir somente à economia tradicional 🙂

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  2. Alencar Junior

    Excelente texto, aborda o tema com clareza, objetividade e de forma simples. Até mesmo pra quem não é da área é fácil o entendimento, dispertou o interesse pelo aprofundamento do assunto.
    Parabéns!

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    • Felipe Augusto de Araújo

      Valeu Alencar! Agora é só se aprofundar nos temas que lhe interessam.

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  3. Ana Maria Roux

    Um bom texto para compartilhar com os alunos de graduação! Simples para ser lido. Parabéns.

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    • Felipe Augusto de Araújo

      Obrigado, Ana. Também acho que o texto pode ser base para uma boa discussão em aula.

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