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É verdade que alguns nudges são descritos apropriadamente como uma forma de “paternalismo leve” porque guiam as pessoas em certa direção. Porém, mesmo quando isso acontece, os nudges são formulados especificamente para preservar a plena liberdade de escolha. Um GPS guia as pessoas em certa direção, mas elas têm liberdade para escolher sua própria rota.

cass sunstein
Foi nomeado Administrador do Escritório de Informações e Assuntos Regulatórios da Casa Branca, Estados Unidos, na administração Obama.
Autor de diversas publicações e livros, foi o pesquisador mais citado internacionalmente em publicações sobre Direito nos anos de 2009 e 2013. Co-autor, junto com Richard Thaler do livro best seller Nudge: Improving Decisions about Health, Wealth, and Happiness.

 

Este breve ensaio contém uma introdução geral à ideia de nudging e uma lista dos dez “nudges” mais importantes. Traz, ainda, uma breve discussão sobre a questão de se criar ou não algum tipo de “unidade de insights comportamentais” capaz de conduzir suas próprias pesquisas ou, alternativamente, depender de instituições existentes.

I. Abordagens que preservam a liberdade

Algumas políticas públicas assumem a forma de imposições e proibições. Por exemplo, a lei criminal proíbe o roubo e a agressão física. Outras políticas têm a forma de incentivos econômicos (inclusive desincentivos), por exemplo, subsídios para combustíveis renováveis, taxas para participar de certas atividades ou tributos sobre gasolina e tabaco. Outras, ainda, assumem a forma de nudges — abordagens que preservam a liberdade e se destinam a influenciar as pessoas em determinadas direções, mas também permitem que elas decidam. Nos últimos anos, instituições públicas e privadas vêm demonstrando interesse crescente no uso de nudges, pois eles geralmente têm baixo custo e bom potencial para favorecer objetivos  econômicos e outros (como a saúde pública).

No dia a dia, o GPS é um exemplo de nudge, assim como um aplicativo que diz às pessoas quantas calorias consumiram no dia anterior, uma mensagem de texto informando ao consumidor que uma conta está vencendo ou que ele tem uma consulta marcada no médico amanhã, um despertador, a filiação automática a um plano de previdência, os ajustes-padrão nos computadores e celulares, um sistema de débito automático para pagamento de faturas do cartão de crédito e hipotecas. Todos
são exemplos de nudge. O governo emprega nudges quando usa alertas eloquentes nas embalagens de cigarros, rótulos que informam sobre a eficiência no uso de energia ou consumo de combustível, “informações nutricionais” sobre alimentos, guias online sobre cardápios saudáveis (ver choosemyplate.gov), regras padronizadas para programas de assistência pública (p. ex., “certificação direta” de crianças carentes para refeições gratuitas na escola), sites governamentais, como data.gov ou data.gov.uk, que contêm numerosos bancos de dados disponíveis ao público, e até o design dos sites governamentais, que apresentam determinados links em primeiro lugar e com fontes grandes.

A. Nudges mantêm a liberdade de escolha

É importante entender que o objetivo de muitos nudges é tornar a vida mais simples, mais segura e mais fácil. Pense nas placas de trânsito, nas lombadas nas ruas, nas informações sobre saúde ou finanças, campanhas educacionais, redução da burocracia e alertas ao público. Quando autoridades reduzem ou eliminam exigências burocráticas e quando promovem a simplicidade e a transparência, estão reduzindo ônus para as pessoas. Alguns produtos (como celular e tablet) são de uso intuitivo e direto. Analogamente, muitos nudges destinam-se a assegurar que as pessoas não encontrem dificuldades quando interagem com o governo ou se empenham para atingir objetivos.

É verdade que alguns nudges são descritos apropriadamente como uma forma de “paternalismo leve” porque guiam as pessoas em certa direção. Porém, mesmo quando isso acontece, os nudges são formulados especificamente para preservar a plena liberdade de escolha. Um GPS guia as pessoas em certa direção, mas elas têm liberdade para escolher sua própria rota. E é importante ressaltar que sempre existe algum tipo de ambiente social (ou «arquitetura de escolha») influenciando as
escolhas. Novos nudges geralmente substituem nudges preexistentes; não introduzem um nudging onde antes não havia nenhum.

B. Transparência e Eficácia

Qualquer nudging oficial deve ser transparente e franco, em vez de oculto e disfarçado. Aliás, a transparência deve ser inerente à prática básica. Suponha que um governo (ou um empregador privado) adote um programa que inscreva automaticamente as pessoas em um programa de previdência, ou suponha que uma grande instituição (digamos, uma cadeia de lojas, ou de lanchonetes que funcionam em prédios do governo) decida aumentar a acessibilidade e a visibilidade dos alimentos saudáveis que oferece. Em nenhum dos casos a ação relevante deve ser oculta, sob nenhuma forma. As decisões do governo, especialmente, devem ser sujeitas ao exame e crítica por parte da população. Uma vantagem importante dos nudges, em contraste com as imposições e proibições, é evitarem a coerção. Ainda assim, eles nunca devem assumir a forma de manipulação ou trapaça. O público tem de ser capaz de analisar e investigar os nudges tanto quanto quaisquer outros tipos de ações do governo.

No mundo todo os países estão altamente interessados em nudges. Vejamos dois dentre muitos exemplos. No Reino Unido foi criado o Behavioral Insights Team, também chamado de Nudge Unit. Nos Estados Unidos existe o White House Social and Behavioral Sciences Team [Grupo de Ciências Sociais e Comportamentais da Casa Branca]. O interesse crescente em nudges deve-se ao fato de que eles geralmente impõem um custo baixo ou nulo, às vezes produzem resultados imediatos (incluindo
economia significativa de recursos econômicos), mantêm a liberdade e podem ser altamente eficazes. Em alguns casos, nudges podem ter um impacto maior do que ferramentas mais caras e coercitivas. Por exemplo, constatou-se que regras default, simplificação e usos de normas sociais às vezes têm impactos maiores do que incentivos econômicos significativos.

No contexto do planejamento da aposentadoria, a inscrição automática em planos de previdência revela-se extraordinariamente eficaz para promover e aumentar a poupança. No contexto do comportamento do consumidor, as exigências de revelação de informações e regras default protegem consumidores de graves danos econômicos, poupando milhões de dólares. A simplificação de formulários para auxílio financeiro tem o mesmo efeito benéfico que milhares de dólares em auxílio adicional (por estudante) quando se trata de aumentar o número de alunos na universidade. Informar
as pessoas sobre o uso de eletricidade e como compará-lo ao de seus vizinhos pode produzir o mesmo resultado positivo na conservação que um aumento significativo na conta de luz. A revelação de informações, se for planejada apropriadamente, pode poupar dinheiro e vidas. A sinceridade do governo ao revelar dados e desempenhos pode combater a ineficiência e até a corrupção.

C. A necessidade de evidências e testes

Para todas as políticas, inclusive a de nudges, é de extrema importância basear-se em evidências e não em intuições, narrativas sobre casos isolados, desejos irrealistas ou dogmas. Os nudges mais eficazes tendem a ser fundamentados nas obras mais valiosas da ciência comportamental (incluindo Economia Comportamental). Portanto, refletem uma compreensão realista de como as pessoas 112 Guia de Economia Comportamental e Experimental responderão a iniciativas governamentais. Contudo, algumas políticas, inclusive alguns nudges, parecem promissoras no plano abstrato mas acabam falhando na prática. Testes empíricos, incluindo testes randomizados controlados, são indispensáveis. Certamente podem surgir surpresas desagradáveis, inclusive consequências adversas impremeditadas, e os formuladores de políticas com sensibilidade devem procurar prever tais ocorrências (e repará-las caso venham a acontecer). Às vezes, testes empíricos revelam que a reforma planejada daria bom resultado, mas que alguma variação, ou alguma alternativa, funcionaria ainda melhor.

A experimentação, com controles meticulosos, é um objetivo fundamental do empreendimento do nudge. Felizmente, muitos experimentos baseados em nudges podem ser feitos com rapidez, a um custo baixo e de um modo que permita a mensuração e o aperfeiçoamento contínuos. A razão disso é que às vezes esses experimentos envolvem mudanças pequenas em programas existentes, que podem ser incorporadas às iniciativas correntes com pouco esforço ou despesa. Se, por exemplo, no momento as autoridades enviam uma carta para incentivar os contribuintes a pagar impostos atrasados, podem enviar variações da carta e testar se são mais eficazes.


A versão completa desta capítulo está disponível gratuitamente no Guia de Economia Comportamental e Experimental a partir da página 110.


Cass Sunstein

Bacharel pela Harvard College e PhD pela Escola de Direito da Universidade de Harvard, onde se tornou editor executivo do periódico Harvard Civil Rights-Civil Liberties Law Review. Trabalhou no Departamento de Justiça norte-americano e depois na Escola de Direito da Universidade de Chicago, onde lecionou por 27 anos na cadeira Robert Walmsley e na cadeira Felix Frankfurter na Escola de Direito da Universidade de Harvard. Foi professor visitante nas Escolas de Direito da Universidade de Columbia e Harvard. Foi nomeado Administrador do Escritório de Informações e Assuntos Regulatórios da Casa Branca, Estados Unidos, na administração Obama. Autor de diversas publicações e livros, foi o pesquisador mais citado internacionalmente em publicações sobre Direito nos anos de 2009 e 2013. Co-autor, junto com Richard Thaler do livro best seller Nudge: Improving Decisions about Health, Wealth, and Happiness.

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