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Os Jogos Econômicos têm sido um importante instrumento para alcançar esse ambicioso objetivo. São delineamentos experimentais voltados a reproduzir, em laboratório, importantes aspectos das interações sociais que envolvem co-dependência, distâncias de poderes, julgamentos sobre justiça ou equidade, competitividade, aversão a desigualdade, altruísmo.

Preferências Sociais é uma área da Economia Comportamental voltada a ampliar as variáveis que são tomadas como determinantes dos comportamentos humanos. Modelos econômicos tradicionais presumem que as pessoas tomam decisões preocupadas exclusivamente em aumentar sua própria satisfação material, ou seja, em maximizar sua utilidade individual. Essa visão não é compartilhada por outros campos científicos que estudam o comportamento humano, especialmente a Psicologia, que vem acumulando evidências de que há outras variáveis atuando em nossas escolhas. O efeito – positivo ou negativo – que causamos sobre outras pessoas consiste em um importante motivador de nossas ações (Fehr & Fischbacher, 2002). Em outras palavras, estudos sobre preferências sociais pretendem examinar com mais cuidado nossos sistemas de utilidades e ampliar as análises pela adição de outros valores. Fehr e Fischbacher (2002) argumentam que, ao desconsiderarem os controles de natureza sociais sobre decisões humanas, os economistas sempre falharão na explicação de: (1) efeitos da competição sobre as tendências de mercado; (2) leis governamentais que regem ações coletivas e cooperativas; (3) efeitos e determinantes de ganhos materiais; (4) contratos e acordos sobre direitos de propriedades; e (5) normas e outras forças sociais determinantes de falhas de mercado.

Os Jogos Econômicos têm sido um importante instrumento para alcançar esse ambicioso objetivo. São delineamentos experimentais voltados a reproduzir, em laboratório, importantes aspectos das interações sociais que envolvem co-dependência, distâncias de poderes, julgamentos sobre justiça ou equidade, competitividade, aversão a desigualdade, altruísmo, etc.

Além de serem uma inovadora ferramenta de pesquisa, Jogos oferecem vantagens práticas e monetárias importantes para o ensino didático e produção de pesquisas. Muitos deles podem ser montados utilizando materiais simples como fichas de papel-cartão, baralhos, folhas de papel impresso para registro dos dados etc. Assim, podem ser facilmente usados em sala de aula para promoverem um ensino didático e motivador de conceitos econômico-comportamentais ou para realizar pesquisas em um cenário acadêmico de verbas restritas. A qualidade desse tipo de pesquisa é mais dependente da qualidade da execução do que de verbas exuberantes.

Há uma enorme variedade de Jogos, replicados há décadas e em diversos centros de pesquisa em todo o mundo (Bardsley, Cubitt, Loomes, Moffat, Starmer, & Sugden, 2010). A seguir apresentados cinco dos Jogos mais usados: o Dilema do Prisioneiro, Jogo do Ditador, Jogo do Ultimato, Jogo da Partilha e Jogo dos Bens Públicos.

O Dilema dos Prisioneiros

Procedimento tradicional: dois “prisioneiros” (jogadores), sem comunicação entre si, devem escolher entre acusar o outro por um crime (“acusar”) ou permanecer em silêncio (“cooperar” com o outro).

Se os dois acusarem um ao outro, ambos passarão um período na prisão. Se os dois cooperarem entre si, serão condenados a penas mais leves (o “juiz” não poderá aplicar penas severas). Se apenas um acusar e o outro não, o acusado será punido com um número maior de anos e o acusador será libertado. Na prática o Jogo é aplicado de maneira mais benevolente e, em vez de anos de prisão, os jogadores efetivamente ganham ou deixam de ganhar dinheiro.

Comportamento-alvo: escolhas entre duas partes submetidas a uma situação de co-dependência, ou seja, em que o resultado para cada uma depende das decisões de ambos.

Dica: Há diversos vídeos explicativos desse jogo disponíveis na internet, em inglês. Um divertido exemplo: https://www.youtube.com/watch?v=t9Lo2fgxWHw

O Dilema do Prisioneiro (DP) estuda o comportamento de escolher entre duas alternativas (acusar versus cooperar), sendo que o resultado final dependerá das escolhas feitas pelos dois participantes. Lembrem-se que os jogadores de fato receberão dinheiro, em lugar de evitarem anos de prisão. Os possíveis resultados do DT estão expostos na tabela a seguir, em que a > b > c > d.

Tabela 1: Resultados possíveis do DP (também chamada de Matriz de Payoffs)

Prisoners Game

A primeira letra de cada par (em itálico) é o resultado para o Jogador 1 e a segunda letra é o resultado para o Jogador 2. Por exemplo, o par a, d significa que o Jogador 1 recebeu o valor a (mais dinheiro) e o Jogador 2 recebeu d (menos dinheiro).

Se os dois cooperarem e se mantiverem em silêncio, ambos recebem o mesmo valor (b, b), que é o segundo maior do jogo. Se os dois acusarem-se um ao outro, ambos recebem um mesmo valor (c, c) que é menor do que a e b, mas maior do que d. Se um acusar e o outro cooperar, o primeiro recebe o valor mais alto (a) e o outro recebe o valor mais baixo (d). Em termos de consequências individuais, se um jogador acusar, ele terá a chance de receber a (mais alto) ou c (baixo, mais ainda maior do que d). Se cooperar poderá receber d (o pior) ou b (menor do que a). A decisão de cooperar, portanto, acarreta riscos de produzir resultado favorável a um jogador e desfavorável ao outro, sem garantia de qual será o lado beneficiado.

Um exame rápido dessas alternativas em uma lógica maximizadora aponta que a melhor opção seria acusar. Essa é a estratégia dominante pela Teoria dos Jogos. A teoria ainda prevê que essa escolha seria feita pelos dois jogadores imediatamente, em uma única rodada. Entretanto, quando esse jogo é efetivamente montado com participantes reais49, isso não ocorre. O que se observa é que muitos optam por cooperar (manter-se em silêncio) e que essas escolhas são sensivelmente afetadas por uma gama de fatores julgados irrelevantes nas formulações matemáticas, tais como as palavras usadas as instruções, o montante total em jogo, o fato de os jogadores se conhecerem ou não etc (Roth, 1995).

A divergência entre previsões teóricas e resultados empíricos do DT suscitou aquecida polêmica e incentivou replicações em diferentes formatos por décadas. Argumentou-se que o equilíbrio teórico seria alcançado se fossem feitas mais rodadas, para que os jogadores pudessem ajustar suas escolhas. Isso, entretanto, não se confirmou. Mesmo após diversas rodadas (ex: 100) e com o ganho final de cada jogador sendo a soma dos ganhos de todas as rodadas, os dados não convergiram ao equilíbrio previsto. Entende-se equilíbrio aqui como sendo a escolha recorrente da(s) mesma(s) alternativa(s) em rodadas subsequentes. Um padrão comumente observado nesses casos é a ocorrência inicial de cooperação (cerca de quatro), seguidas inevitavelmente de uma acusação e de subsequente alternância entre cooperações e acusações (Roth, 1995).

O fato de que, mesmo após terem sido expostos aos benefícios da acusação, os participantes inevitável e repetidamente cooperarem, sugere haver outros tipos de reforços em ação, além do mero ganho líquido de cada jogador. Mais ainda, observa-se a formação de padrões intertemporais (equilíbrios) com a alternância de acusações e cooperações entre rodadas. Tais resultados advogam pela necessidade de se aprimorar o escopo das previsões de padrões de escolha, para explicar a formação de composições entre os quatro resultados possíveis desse jogo. Essa linha de investigação é chamada de “Equilíbrios de Estratégias Mistas” (Mixed-Strategy Equilibrium) e está voltada a experimentos em que o equilíbrio observado consiste na formação de combinações (“pacotes”) das escolhas possíveis.

A versão completa desta capítulo está disponível gratuitamente no Guia de Economia Comportamental e Experimental a partir da página 227.


carol-trousdellCarol Franceschini
Analista do comportamento econômico. Formada em Economia (UNESP) e Psicologia (USP), mestre e doutoranda em Psicologia Experimental (USP e Reed College, Estados Unidos), MBA em Finanças Corporativas (FIA-USP) e especialização em Negociações (FGV-SP). Experiência profissional em Fusões e Aquisições de Empresas (Mergers and Acquisitons – M&A) e em Derivativos Estruturados pelo Chase Manhattan Bank, nos escritórios de Nova York e São Paulo. Coordenadora de grupo de estudos em Economia Comportamental no IP-USP e autora livro, capítulos de livros e artigos científicos em periódicos nacionais e internacionais. Desenvolve pesquisas experimentais sobre os efeitos de variações de renda sobre os comportamentos econômicos de trabalhar, investir e consumir.

Felipe Felipe Augusto de Araújo
Cursou graduação (Universidade Federal de Juiz de Fora) e mestrado (Universidade Federal de Minas
Gerais) em Economia e atualmente é estudante de doutorado em Economia pela Universidade de Pittsburgh, EUA. Tem interesse em pesquisas em Economia Comportamental, Economia Experimental, e Desenvolvimento Econômico. Trabalhos recentes incluem análise do comportamento individual em jogos dinâmicos no laboratório e investigação do efeito de choques econômicos no comportamento econômico de longo prazo.

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