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O processo de tomada de decisão é extremamente complexo e sua compreensão envolve aspectos da psicologia cognitiva, economia comportamental e neurociência cognitiva, dentre outros.

Estudos recentes têm contrariado a noção de racionalidade proposta nos modelos clássicos sobre como deveria ocorrer a decisão. O decisor sofre a influência da forma como a informação é apresentada, dos filtros que usa para selecionar a informação que considera relevante, do grupo ao qual pertence e que sofrerá as consequências de sua decisão. Todavia, deve-se considerar que a decisão só ocorre porque o decisor tem um problema a ser solucionado. A geração de alternativas e a escolha de uma delas é consequência da exigência de resolução do problema.

As decisões ocorrem dentro de contextos específicos. As empresas brasileiras operam em contextos extremamente regulados. Entende-se a regulação como qualquer organização da atividade econômica através do Estado, seja intervindo na concessão do serviço público, seja exercendo o poder de fiscalização. Assim, o governo edita regras, garante sua aplicação e pune aqueles que delas se distanciam. Essa imposição de regras pretende garantir a implementação das políticas de governo, interferindo assim sobre a conduta dos cidadãos sob a alegação de que, com essa intervenção, estarão garantidos os direitos fundamentais dos mesmos.

Um exemplo é a regulação fiscal (tributos e obrigações acessórias) que é extremamente complexa e gera para as empresas\ o risco fiscal, que é um dos componentes do risco operacional. Essa situação é bastante sensível porque, no Brasil, um terço da riqueza produzida converte-se em recolhimento de tributos e só no primeiro semestre de 2017 foram aplicadas multas na ordem de R$ 74 bilhões por conta de não cumprimento da legislação a eles relacionada (BRASIL, 2018). Esse aspecto fiscal e outros relacionados à própria abertura de novos negócios mostram que o contexto é bastante complicado para quem se aventura a iniciar um negócio no Brasil ou para que as empresas cresçam, especialmente as micro e pequenas.

Todavia, deve-se considerar a percepção que os empresários e a população, de modo geral, têm quanto às regulações tributárias; por exemplo, a carga tributária brasileira é muito alta e parece não haver concordância de que seja justa a aplicação dos recursos assim arrecadados, garantindo os direitos fundamentais da população, como o governo alega. Se a percepção fosse favorável, mudaria a propensão à aceitação do pagamento de tributos?

Outro aspecto a ser discutido quanto à regulação é a percepção que se tem, nas empresas, do tempo requerido para apuração dos tributos, caso de nosso exemplo. As exigências relacionadas à regulação podem ser percebidas como um dos fatores que aumentam a sensação de restrição de tempo para execução das tarefas.   Em outras palavras, para atender às  demandas de regulação fiscal nas empresas as pessoas responsáveis por esses processos podem considerar que o tempo necessário para a apuração é, na prática, menor do que o tempo disponível para cumpri-la. Isso gera a sensação de pressão de tempo, e frente a decisões nessa condição o decisor tende a: filtrar informações (usar só as que lhe parecem viáveis), basear sua decisão em processos mais intuitivos, menos analíticos; ignorar deadlines por considerar a impossibilidade de cumpri-los (Rastegary & Landy, 1993; Romano & Brna, 2001; Ordóñez; Benson & Pittarello, 2015). Ou seja, a regulação, em si, pode ser responsável pelos erros, que se transformam em riscos e em possibilidade de aumento de autuações para as empresas.

Finalizando, pergunta-se: a regulação atende mais à conservação dos direitos do ente regulado ou aos direitos daqueles que se beneficiariam dessa regulação? Haveria um nível ideal de regulação que aumentasse a propensão do empreendedor a correr os riscos relacionados, por exemplo, à inovação?


REFERÊNCIAS

Brasil (2018). Secretaria da Receita Federal do Brasil. Plano Anual de Fiscalização da Secretaria da Receita Federal do Brasil para o ano-calendário de 2018: quantidade, principais operações fiscais e valores esperados da recuperação de crédito tributário. Resultados de 2017. Disponível em http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/resultados/fiscalizacao/arquivos-e-imagens/2018_02_14-plano-anual-de-fiscalizacao-2018-versao-publicacao_c.pdf. Acesso em 22.06.2018.

Órdoñez, L.D; Benson III, L. & Pittarello, A. (2015). Time-pressure perception and decision making. In G.Keren & G.Wu (Eds). The Wiley-Blackwell Handbook of Judgment and Decision Making. New York, NY: The Wiley- Blackwell

Rastegary, H & Landy, F.J; (1993) Time urgency, uncertainty, and time pressure. In  A.J.Maule (Eds). Time pressure and stress in human judgments and decision making. New York, NY: Plenum Press.

Romano, D.M & Brna, P. (2001). Presence and reflection in training: support for learning to improve quality decision-making skills under time limitations. Cyber Psychology & Behavior. v.4 (2).

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